CRÔNICA - Plácido e os nomes da rua

Quem recolhe muito bicho da rua, como o Plácido, que é um protetor de animais e também é professor da Rede Pública, além dos óbvios problemas de grana e espaço, sofre com a falta de nomes para batizar seus resgatados.
A primeira cachorrinha que cruza sua vida ou de seus colegas, com uma história triste, sempre leva o nome de Vitória, para relembrar a superação. Depois, dar nome para a primeira dezena até que vai ser fácil, e costuma-se queimar os clássicos. Em alguns segundos vêm à mente nomes consagrados, como Rex, Laika, Apolo e Jade (aliás, tem bicho que tem mesmo cara de Laika ou de Rex).
Já chegando à casa dos vinte resgates, apela-se para as cores, e aí aparecem os Neguinhos, as Branquinhas, o Marrom, Loirinho e até o Marfim. Passados os trinta bichos, lança-se mão dos nomes de amigos que também resgatam e trocam bichos entre si e pintam os Diegos, as Clarinhas, os Silvinhos, as Goretes, as Lucinhas. Mais um pouco e torna-se necessário tomar emprestado também os nomes de algumas comidas e surgem Paçocas, Pipocas, Petiscos, Caramelo, Feijão e Habib´s.
A falta de nomes começa a imperar na casa dos 50 animais recolhidos e o nome do local do resgate passa a batizar o bicho. Da Rua, Do Rio, Barranco, Itaquera, Aricanduva, Ponto, Favelinha, Motorzinho, Anchieta, Fernão e Raposo.
Dependendo da meteorologia na hora do resgate, amanhecem os Chuvinhas, as Neblinas e os Ventanias. Na falta de outras idéias, ressaltam-se algumas características que eles tinham no momento em que foram encontrados, como Pulguinha, ou Chorona, ou de como ficaram depois da cirurgia: Zoínho, Mãozinha ou Três Patinhas. O tamanho da cintura e a cor do pelo marcaram a Bola Sete, o topete arrepiado e a irreverência elegeram o Neymar.
Há casos de animais resgatados de cemitério, e o nome que estava na campa mais próxima renasceu no recolhido, como Dona Alzira e Seu Pereira. O instrumento utilizado no resgate batizou o Cambão, e o pai do Gigante, que embora menor que o filho, recebeu o nome de Pai do Gigante.
Alguns cantores famosos também acabam sendo homenageados, e brilham Amys, Rauls e Marias Ritas. A época do ano também já salvou muito bicho de ficar sem nome: Natalina, Dom Pedro e Carnaval são alguns destes, que resolveram se perder no feriado.
Sua ordem na fila também conta, e nomeou o Trinta e Sete.
Quando se sabe que é filhote, branquinho e vai ficar pequeno, ou então é gato amarelo, todo mundo quer, portanto tem muitas chances de uma boa adoção, e como nas agências de carro usado, recebem o nome de Filé.
Plácido, que faz parte desta gente, já não tinha mais de onde tirar nome para tanto cachorro e gato, resgatado por ele e pela sua turma.
Tomadas as medidas iniciais, que eram ver para qual clínica encaminhar para os primeiros socorros e também quem iria segurar a onda das despesas, faltava apenas o nome.
Atrasado para o trabalho, como sempre, Plácido olhou para o relógio. Assim sendo, imediatamente o cachorro Onze Horas foi encaminhado para uma nova vida e uma nova chance de ser feliz.
E na figura do Plácido vai nossa homenagem a sua turma, compostas de Neusas, Batistas, Lourdes, Raquéis, Lúcias, Sandras, Ângelas, Cidas, Simones, Kátias, Mirians, Claras, Franciscas, Marias e felizmente tantos outros... 
Veterinário Wilson Grassi

CONTRIBUIÇÃO DE LEIDIANE

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